quinta-feira, 27 de junho de 2019

O Pior Inimigo do Agronegócio


Nada menos do que 95% dos alertas de desmatamentos nos primeiros três meses de 2019 no Brasil aconteceram em áreas onde não havia autorização, e 40% aconteceram em áreas que deveriam estar protegidas de qualquer tipo de desmatamento ou degradação.

Estes são os dados do projeto MapBiomas Alerta, que valida com imagens de alta resolução e gera laudos completos para cada desmatamento detectado em todo o Brasil pelos sistemas de alertas em operação como Deter/Inpe, SAD/Imazon ou Glad. Foram validados 4.755 alertas cobrindo mais de 89 mil hectares que se espalham por todos os biomas e todos os estados brasileiros. Mais de 3.500 propriedades rurais foram afetadas com desmatamento.

O Brasil tem mais de cinco milhões de propriedades registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR), e a fração que está desmatando em pleno 2019 representa menos de 0,2% do total de propriedades. Ou seja, o desmatamento é coisa da minoria, mas o estrago é para todos.

É estarrecedor o grau de ilegalidade verificado no desmatamento no Brasil. O caminho para acabar com essa praga passa necessariamente por garantir que aquele desmata ilegalmente seja exemplarmente punido e repare – em campo – o dano causado. Esta posição tem sido defendida não só por ambientalistas, mas também por coletivos multissetoriais como a Coalizão Clima, Floresta e Agricultura e associações de classe empresariais como Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e Industria Brasileira de Árvores (IBA).

Mas tem gente querendo cortar o caminho aplicando uma verdadeira pelada florestal. Em vez de se adequar à lei, querem mudar o Código Florestal para acabar com a Reserva Legal (área mínima a ser protegida nas propriedades rurais) e com o licenciamento ambiental para autorização de desmatamento e rever e reduzir as Unidades de Conservação e Terras Indígenas.

Com uma canetada, querem jogar o Brasil no centro do atraso civilizatório, com consequências não só para a disponibilidade de serviços ambientais (exemplo, disponibilidade de água, polinização e patrimônio genético) mas também para o acesso ao mercado internacional cada vez mais comprometido para o fim do desmatamento das cadeias de produção globais.

Esta gente que propõe tais desfigurações da legislação ambiental representa as forças mais atrasadas do agronegócio brasileiro – aquele meno de 1% que quer ver anistiado o seu desmatamento ilegal. Durante anos, uma boa parte do restante do agronegócio se deixou representar por estas forças retrógradas e parecem agora estar despertando. Essa minoria retrógrada não pode destruir a imagem e a base dos recursos naturais fundamentais para manter e fomentar uma agropecuária pujante e sustentável. Se o fizerem, se tornarão os piores inimigos do agronegócio e do meio ambiente no Brasil.

Publicado em O Globo em 27.06.2019