quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Que falta faz um(a) lider

Depois de muito hesitar, a presidente Dilma resolveu participar da Cúpula do Clima convocada pelo secretário- geral do ONU para elevar o grau de ambição politica dos compromissos para o período pós-2020, que formarão o novo acordo climático a ser firmado em 2015.

Os sete minutos de fala da presidente Dilma seguiram o script burocrático e pouco inspirado com que o tema mudanças climáticas (e sustentabilidade em geral) tem sido tratado no seu governo. Ela ficou presa ao passado e não articulou uma visão de futuro que se espera de um chefe de Estado.

É óbvio que devemos nos orgulhar de termos reduzido o desmatamento da Amazônia em 70% na última década, mas é preciso projetar ir além, sabendo que ainda somos o país que mais desmata em todo o mundo. A cúpula era o momento para afirmar novos compromissos substantivos do país, como o fim da perda de cobertura florestal e/ou a retomada da participação das energias renováveis na matriz energética.

Mas nossa agenda interna não permite. O desmatamento parou de cair e nos dois últimos anos voltou a crescer na Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado. A participação das fontes renováveis na matriz energética caiu de 45% para 41% nos últimos cinco anos e o governo hipoteca o futuro do país aos investimentos em petróleo.

Embora tenha citado a Marcha do Clima que reuniu centenas de milhares de pessoas em todo o mundo no ultimo domingo, a presidente não conseguiu se sintonizar com a demanda das ruas por compromissos claros e substantivos para o período pós- 2020.

A diferença que faz uma liderança é gritante. Em 2009, quando o mundo se preparava para a Conferência de Clima em Copenhagen, o presidente Lula assumiu compromisso de reduzir o desmatamento na Amazônia em 80% até 2020, e as metas para redução de emissões totais do Brasil em 36% em relação à tendência histórica até 2020. Nas semanas seguintes ao anúncio brasileiro, países- chave como China, Índia, Indonésia e México anunciaram também metas de redução de
emissões.

Durante a Conferencia de Copenhagen, o presidente emocionou o mundo ao pedir a palavra para fazer uma apelo para que China e Estados Unidos destravassem as negociações, inclusive oferecendo colocar recursos no Fundo Global para o Clima ( proposta de Marina Silva que havia sido menos prezada por Dilma, então ministra da Casa Civil e pré-candidata a presidente).

Para além da competência da diplomacia brasileira e de um ministro de Relações Exteriores que conhece com profundidade o tema, o Brasil precisa recuperar o protagonismo na agenda climática com a liderança da Presidência da Republica.


Publicado em O Globo 24/09/2014

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

A mudança climática chegou às ruas

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Domingo, dia 21 de setembro de 2014, entrará para a história como o dia em que o enfrentamento das mudanças climáticas transbordou dos domínios da ciência, dos especialistas e dos gabinetes dos políticos e embaixadores para as ruas.
Quase 600 mil pessoas saíram às ruas em mais de 2700 eventos, em 161 países, para demonstrar o seu apoio a agenda de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Em Nova York, uma multidão de pelo menos 300 mil pessoas ocupou as ruas da cidade para protestar contra o subsídio aos combustíveis fósseis, o fraqueamento para produção de gás, o abandono das pequenas ilhas à sua própria sorte com aumento do nível do mar, o lobby do petróleo e do carvão, o desmatamento e principalmente cobrar – em alto e bom som – que os chefes de estado, que se reúnem em NY a partir de amanhã (23) para a Cúpula do Clima e a Assembléia Geral da ONU, assumam compromissos realmente ambiciosos para redução das emissões de gases de efeito estufa e preparação dos países para se adaptar às mudanças climáticas.
Apesar do esforço do Secretario Geral do ONU, Ban Ki-Moon, de organizar a Cúpula do Clima com o propósito de buscar maior ambição dos países nesses compromissos – antes da Conferência das Partes da Convenção de Mudanças Climáticas que ocorrerá em dezembro, no Peru (COP20) -, os sinais são de poucos anúncios relevantes durante a semana.
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Para reforçar a ação promovida por mais de 1200 organizações não governamentais dezenas de personalidades acompanharam a manifestação. Em NY, durante a marcha, Ban Ki-moon circulou acompanhado pelo prefeito da cidade, Bill de Blasio, pelo ex-vice Presidente americano e Nobel da Paz, Al Gore, e pela primatóloga Jane Goodall (foto acima).
A marcha acontece em meio ao anúncio dos pesquisadores do Global Carbon Project*que as emissões de gases de efeito estufa continuam subindo e em 2013 bateram o recorde histórico. Apenas o setor de energia e cimento emitiu 36 bilhões de toneladas de CO2. Desde 1990, o crescimento ultrapassa os 60%. No ritmo atual das emissões, oaquecimento global chegaria a 3,2 a 5,4ºC até o final do século, portanto muito acima dos 2ºC proposta pelo IPCC como limite ainda seguro de aumento da temperatura média global.
O crescimento do consumo de carvão respondeu por 59% do aumento das emissões globais, seguido do petróleo e do gás com outros 28%. Os subsídios à produção e ao consumo de combustíveis fósseis ultrapassam os US$ 500 bilhões de dólares ao ano, segundo o PNUD. Este quadro precisa ser revertido e a decisão dos países sobre a contribuição que podem dar ao novo acordo climático global a ser aprovado em 2015 é fundamental.
Que a marcha sirva de inspiração para os chefes de estado presentes em NY esta semana, para que tomem posições mais ambiciosas. O povo está saindo às ruas e a pressão deve continuar.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Marcha das Pessoas e a Cúpula de Clima

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Na próxima semana, acontecerá em Nova York a Cúpula do Clima, convocada pelo Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, com o objetivo de estimular o anúncio de ambiciosos compromissos dos países com a mitigação e adaptação as mudanças climáticas, que sirvam de alicerce para o novo acordo global de clima em gestação, que deve ser aprovado em dezembro de 2015, em Paris.
Na lista de mais de cem chefes de estado e de governo que confirmaram a participação na Cúpula – que acontece um dia antes da abertura da Assembleia Geral da ONU -, algumas ausências são sentidas como as dos Primeiros Ministros da China, Índia e Canadá e o Presidente Russo Vladimir Putin. A Presidente Dilma já foi confirmada pelo Secretariado da ONU, embora ainda não apareça em sua agenda. Sobre a mensagem e os compromissos que levará a Cúpula, ainda há mistério.
No dia 21 próximo, domingo que antecede a Cúpula, está programada uma enormeMarcha pelo Clima, inspirada na Marcha pela Paz e pelo desarmamento nuclear que reuniu mais de um milhão de pessoas no Central Park, em junho de 1982. Desta vez, além da marcha em NY, outras dezenas de marchas deverão ser realizadas em vários pontos do mundo, inclusive no Rio de Janeiro, como já noticiado no site do Planeta Sustentável.
A mensagem das mais de mil ONGs que organizam as marchas é simples: os lideres globais têm que assumir compromissos ambiciosos e corajosos para reduzir drasticamente as emissões globais de gases de efeito estufa e promover uma economia descarbonizada e inclusiva.
A uma semana dos eventos o que se vislumbra de compromissos inclui:
  • O anúncio de criação da Aliança pela Agricultura Inteligente (Aliance for Smart Agriculture), destinada a promover a agricultura de baixo carbono e que deve reunir cerca de 20 países e 20 grandes empresas e instituições internacionais como FAO;
  • Declaração sobre florestas que deve estimular mais acordos bilaterais e multilaterais para promover a redução de emissões por desmatamento e degradação florestal (REDD). Duas parcerias bilaterais – nos moldes do Fundo Amazônia - entre países tropicais e a Noruega devem ser firmadas durante a Cúpula (talvez as ações mais concretas e ambiciosas desse encontro);
  • Acordo para promover o desmatamento zero no Brasil está sendo costurado com o envolvimento de ONGs e grandes empresas consumidoras de produtos agrícolas e florestais, mas ainda é incerto se será assinado durante a Cúpula;
  • Uma série de países e entidades empresariais deve reforçar a ideia de que é preciso cobrar pelas emissões de carbono, eliminar subsídio de combustíveis fósseis e usar os recursos para promover a economia de baixo carbono.
É pouco. Os sinais dados pelos lideres globais não são muito animadores. Não se vislumbra nenhum grande compromisso com a redução de emissões ou aporte de recursos para adaptação sendo anunciados da Cúpula.
Resta torcer para que os líderes estejam guardando as boas notícias para anuncia-las, de surpresa, na Cúpula ou mesmo em resposta à Marcha pelo Clima que antecede a reunião. Mas isso está mais para desejo esperançoso do que possibilidade real.

Publicado em Planeta Sustentável em 15.09.2014

sábado, 13 de setembro de 2014

Ponto de Ruptura

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À medida que se aproxima a Cúpula do Clima – convocada pelo secretário geral da ONU, Bank Ki-moon,para o dia 23 de setembro, em Nova York – uma série de iniciativas paralelas vão tomando corpo. Uma das mais significativas é a Marcha pelo Clima (People´s Climate March) que pretende ser a maior demonstração pública já realizada sobre mudanças climáticas.
Organizada de forma coordenada por mais de mil organizações de todo o mundo e tendo como epicentro o movimento 350.org*, o encontro é inspirado na marcha antinuclear que reuniu mais de 1 milhão de pessoas no Central Park, em Nova York, além de outras milhares em vários pontos do mundo em 12 de junho de 1982.
Entre as diversas ações para preparar esta marcha foi produzido excelente documentário – Disruptiondisponível gratuitamente na internet - sobre a ameaça das mudanças climáticas e a necessidade de mobilização para ação imediata.
A primeira metade do filme apresenta excelente revisão da ciência do clima de forma simples e objetiva e o que precisa ser feito para limitar o aquecimento global e suas consequências climáticas.
Disruption foi produzido e dirigido por Kelly Nyks e Jared P. Scott (produtores de Split – a divided America (2008), documentário sobre a divisão americana entre democratas e republicanos), que, no site, estimulam os interessados a promoverem sessões públicas do filme.

Publicado em Planeta Sustentável em 09.09.2014