A 19ª
Conferencia das Partes da Convenção das Nações Unidades sobre Mudanças
Climáticas (COP19 do Clima), realizada em Varsóvia, poderia ser
lembrada como a COP Moon Walk,
aquele passo celebrizado por Michael Jackson, com o qual parecia andar
para frente, mas, na verdade, não saia do lugar ou até o levava para trás.
Das 27 decisões aprovadas na COP podemos
extrair três temas de destaque, com alguma novidade:
1. Avanço na plataforma de Durban (caminho para novo acordo climático);
2. Mecanismo Internacional de Varsóvia para Perdas e Danos associado aos impactos das mudanças
climáticas e
3. Plataforma de Varsóvia para REDD+ (conjunto de sete decisões).
REDD+, UM CAPÍTULO À PARTE
Depois de oito anos
de debates, o pacote de decisões que apoia o REDD+ ou Redução das Emissões por
Desmatamento e Degradação Florestal, incluindo manejo e conservação, chega
finalmente ao ponto de poder ser operacionalizado. Apesar de ser apresentado
como grande novidade, o fechamento deste pacote de decisões sobre REDD chega
com atraso de, pelo menos, quatro anos. O conjunto de decisões mais de 10
decisões das ultimas COPs permite maior clareza do conceito, escala e escopo de
REDD+. Também esclarece como se mede a redução de emissões (incluindo
a definição de valores de referência) e reconhece os mecanismos de pagamento
por resultados e as salvaguardas necessárias para aplicação de distribuição dos
recursos financeiros pago por estes resultados de forma a resguardas a
integridade ambiental e social das iniciativas de REDD.
Anúncios de novos
recursos financeiros (US$ 280 milhões) foram feitos na conferência, mas nada
que altere substancialmente os compromissos assumidos nos últimos cinco anos em
relação ao REDD, e ainda longe de serem suficientes para a sustentação de médio
prazo das iniciativas nacionais.
Muitas questões ainda
devem ser definidas ao longo dos próximos anos como a forma, as modalidades e
os valores para pagamento por resultados,
além da garantia do fluxo de recursos para incentivar o REDD em escala global.
MITIGAR E ADAPTAR
Em COPs anteriores,
ficou claro que deveria ser criado um mecanismo para lidar com perdas
e danos (loss and damage)
associados aos impactos das mudanças climáticas,
tanto por eventos extremos ou como processos progressivos de longo prazo já em
curso como o aumento no nível do mar.
Este seria o terceiro pilar do debate climático que, desde 1992, tinha por base
o binômio mitigação-adaptação.
Mitigar é lutar para limitar
as mudanças climáticas e adaptar é preparar-se para reduzir os impactos
futuros das mudanças do clima. A criação do mecanismo de perdas e danos representa
o reconhecimento dos impactos que já estão acontecendo e para os quais a
estratégia de adaptação não dá conta.
Cada um dos pilares
estabelecidos teria mecanismos e meios de implementação próprios para lhes
conferir a agilidade e a presteza necessárias. Mas a decisão em Varsóvia
estabeleceu, de forma genérica, um mecanismo internacional como parte da Plataforma de Cancun para
Adaptação (CAF – Cancun Adaptation
Framework). O texto é
amorfo ao tratar de responsabilidades e mecanismos concretos em caso de eventos
climáticos extremos, com perdas e danos para países mais vulneráveis.
Países desenvolvidos
– responsáveis pela maior parte das emissões históricas que se
revertem em impactos neste momento – bloquearam qualquer menção às suas
reponsabilidades de forma a impedir que possam ser instadas a pagar toda a
conta das perdas e dos danos causados. Até mesmo a proposta brasileira de se
desenvolver uma metodologia para avaliar a contribuição histórica para as
mudanças climáticas atuais(considerando
os efeitos acumulativos dos gases de efeito estufa) foi sumariamente rechaçada.
FORMA DO NOVO ACORDO
Mas, de longe, a mais
fundamental e aguardada decisão em Varsóvia se refere à definição do guia de
conteúdos para compor o novo acordo climático de 2015, para valer a partir de 2020. Nas
palavras de várias lideranças, seria uma espécie de índice de conteúdos do que
constaria no novo acordo e que deveria ser desenvolvido nos debates de 2014
para pudessem formar o conteúdo básico de formulações que integrariam uma
primeira proposta de texto para o acordo de 2015 a ser publicado no final de
2014 ou primeiras semanas de 2015. Esse tempo é necessário para que se tenha
tempo suficiente para digerir e negociar o texto final até a COP21, que será
realizada em dezembro de 2015, em Paris.
A proposta de decisão
para COP produzida pelo ADP (AdHoc
Working Group on Durban Plataform on Enhanced Action) grupo de trabalho em que este debate é tratado, trazia
em sua primeira versão, um índice temático na forma de um anexo simples e
claro. Ao longo dos dias o conteúdo foi sendo diluiído (à
certa altura era algo do tipo “lista não exaustiva de temas para
aprofundamento”) até
ser eliminado nas últimas horas de negociação.
O que restou foi um
documento fraco que, na parte mais essencial, definiu que os países
apresentarão suas contribuições (leia-se, compromissos/metas) para o
período pós 2020 até o primeiro trimestre de 2015. Ou seja, o que era para
acontecer em 2014 ficou para o ano seguinte e sem qualquer parâmetro (ex.
ano base; métrica) que
possa servir de base para que seja feita uma análise concreta e direta sobre a
compatibilidade destas contribuições com os limites de emissão sugeridos pelo 5o relatório
do IPCC.
MUDAR A DANÇA
Saímos de Varsóvia
sem a lição de casa feita. Toda a pressão foi transferida para 2014, ou seja,
para a COP20, que será realizada em Lima, no Peru, na primeira quinzena de
dezembro. Para correr atrás do prejuízo foram aprovadas sessões extras de
trabalho que serão realizadas, antes, em março, maio e novembro.
Além
do pouco avanço nos temas essenciais, ao longo das duas semanas de conferência,
tivemos várias notícias desestimulantes como a redução das metas de mitigação
do Japão e a reversão de parte da política de clima na Austrália. Ainda que
circunstanciais, são sinais ruins já que o nível de ambição precisa aumentar e
não diminuir, caso contrário o excesso de emissões até 2020 impedirá o início
de uma trajetória global de queda, como insistentemente recomendado pelo IPCC.
Em 2014, o desafio é
mudar a dança, nem que seja para um Moon Walk invertido – ou EarthWalk -, na
qual os movimentos são de passos para trás, mas a resultante é uma caminhada
para frente.
Publicado em Planeta Sustentável em 27/11/2013