quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Partindo na contramão

A cena é chocante. De qualquer ponto um pouco mais alto nas grandes cidades brasileiras se observa, especialmente nos períodos de inversão térmica no inverno, uma densa camada cinzenta flutuando sobre a área urbana.  Só em São Paulo o Laboratório de Poluição Atmosférica e Saúde da Faculdade de Medicina da USP estima que 4 mil pessoas morrem por consequências desta poluição causada essencialmente pela circulação de veículos na cidade. 

Além de comprometer a saúde, os veículos representam mais da metade das emissões de gases de efeito estufa da cidade.

A poluição dos veículos esta relacionada de forma simplificada e quatro fatores: o tamanho da frota de veículos, o tipo de combustível utilizado, a intensidade de uso dos veículos e a eficiência e regulagem dos motores.

Hoje vivemos um sistema perverso:  insuficiência e ineficiência do transporte público associados aos incentivos econômicos para veículos particulares (crédito fácil, subsídios etc) favorece o aumento da frota em circulação que travam o trânsito o que por sua vez aumenta a intensidade de uso dos veículos, inclusive os de transporte publico. Para complicar ainda mais o subsídio a gasolina diminui o consumo de alcool (menos poluente). A resultante é aumento de emissão de poluentes.

Nos últimos anos um dos fatores que tem amenizado os impactos deste quadro em São Paulo é programa de inspeção veicular obrigatória que controla da variável regulagem dos motores.

De uma forma simples trata-se de verificar anualmente se os veículos estão respeitando os limites de emissão para cada modelo. Quando é reprovado o veículo deve ser regulado e refazer o teste. Em 2011, 25% dos veículos foram reprovados na primeira inspeção, em 2012 este percentual caiu para 20%. Ao contrário do que se imagina, veículos novos também são afetados. Em 2011, 8% dos veículos com até 5 anos foram reprovados.  Cerca de 500 mortes foram evitadas em SP em decorrência das regulagens de motor provocadas pela inspeção veicular.

Diante deste quadro seria razoável  que o novo prefeito de São Paulo ao assumir buscasse fortalecer o programa de inspeção veicular para reduzir a absurda taxa de 20% dos veículos reprovados. Ao invés disso, o Prefeito Fernando Haddad ao assumir propôs, como uma das primeiras medidas, rever o programa tornando-o bianual, subsidiado pela prefeitura e isentando os carros com até 5 anos.  Em suma, enfraquece o controle de poluição e aumenta o subsídio ao transporte individual às custos dos cofres públicos.

O uso transporte individual beneficia basicamente o seu usuários direitos, mas os custos de seus impactos decorrentes no trânsito, manutenção de vias, saúde entre outros  recai sobre toda sociedade.

Ainda é tempo do novo prefeito esquecer este infeliz início e focar nas políticas de mobilidade urbana para ampliar a oferta, qualidade e eficiência e estimular o uso do transporte público e restringir, limitar e desestimular o transporte motorizado individual. Enfim, sair da contramão.  

Publicado em O Globo, em 09-01-2013