Qual destas afirmações é falsa? O Brasil é o pais com a maior proporção
de energias renováveis na matriz elétrica e é o país com mais florestas
no mundo. As duas são falsas. Há pelo menos 20 países que têm mais
eletricidade renovável que o nosso (incluindo
Noruega, Islândia e Colômbia), e a Rússia possui quase o dobro da área
de florestas.
O que leva à propagação destas afirmações repetidas, inclusive por
autoridades e doutores, é, via de regra, um misto de desatualização,
mistura de conceitos e retirada de contexto. No caso das afirmações
sobre a sustentabilidade do agronegócio brasileiro propalada
pelo ministro da Agricultura, há uma mistura oportunista destes vícios.
O ministro diz que o Brasil é uma das maiores potências agrícolas do
planeta, ocupando apenas 7,6% do território, enquanto a média do mundo é
30% e da Europa, 45%. A agropecuária brasileira seria, assim, um ponto
fora da curva de produtividade e não deveria
ser demonizada pelo desmatamento; afinal, o Brasil tem 66% do
território com vegetação nativa.
O agronegócio brasileiro é, sem sombra de dúvida, uma potência, o quarto
maior produtor de alimentos do planeta e o maior entre os países
tropicais. Para isso, o país ocupa 32% do território com atividade
agropecuária, e não 7,6%, que correspondem apenas à
área de cultivos agrícolas, sem contar a pecuária. Nos estados de
ocupação consolidada, o percentual é ainda mais alto: São Paulo, Minas
Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Paraná, por exemplo, têm mais
de 65% do território com uso agropecuário. Mesmo
Mato Grosso, ainda na fronteira agrícola, já alcança 37% de ocupação.
No Brasil, temos mais de 270 milhões de hectares dedicados ao setor
agropecuário. Somente a China e os EUA (o primeiro e o terceiro maiores
produtores de alimento) possuem áreas maiores de agropecuária (mas
também têm território maior que o do Brasil). Mais
interessante é o caso da Índia, com uma população seis vezes maior e
metade do território do Brasil — o segundo maior produtor mundial de
alimentos —, que ocupa apenas 170 milhões de hectares com atividade
agropecuária, ou seja, é muito mais produtiva do que
nós.
Mesmo depois de reduzir as taxas históricas de desmatamento, o Brasil
ainda é o país que mais desmata vegetação nativa no mundo, e mais de 80%
deste desmatamento são causados pela expansão agropecuária. A atividade
acaba, assim, por responder por mais de 70%
das emissões de gases de efeito estufa do Brasil — que é o sexto maior
emissor do planeta.
Como também já disse o ministro da Agricultura, não precisamos desmatar
mais um hectare para aumentar nossa produção agropecuária. Nosso desafio
é melhorar a eficiência no uso das terras já dedicadas à atividade, em
especial as áreas de pecuária de baixa produtividade.
Com isso, poderíamos zerar o desmatamento, aumentar a renda do produtor
rural e tornar o Brasil uma bomba de remoção de carbono na atmosfera.
Seria interessante o ministro assumir o compromisso e garantir junto ao
setor o desmatamento zero da vegetação nativa remanescente no Brasil.
Este seria, sim, o maior ato de promoção do agronegócio brasileiro. Sem
nenhum exagero.
Publicado em O Globo 27.12.2017