sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Não é pelos 15 MtCO2

Em texto publicado neste blog em 31/07, comentei o 1º Leilão de Energia de 2013 (que será realizado no final deste mês) para contratação de energia a ser entregue em 2018. Se todas as termoelétricas a carvão e a gás inscritas forem contratadas (2.400 MWh), isso deverá gerar um acréscimo de emissões anuais de Gases de Efeito Estufa (GEE) da ordem de 15 milhões de toneladas de CO2 (tCO2) por ano, o que equivale a toda emissão de CO2 da geração de toda energia elétrica no Sistema Integrado Nacional, em 2011.

Entre as reações ao meu post surgiram algumas teses, como estas:
(a) Embora 15 milhões tCO2 fosse um aumento expressivo de emissões de nosso sistema elétrico, seria muito pouco se comparado com nossas emissões totais anuais e de países como China e Índia, que ainda estão investindo pesado nas termoelétricas a carvão;
(b) O Brasil já é um país de baixas emissões e, portanto, tem ainda espaço para crescer, enquanto os países desenvolvidos ainda precisam cumprir a sua parte, reduzindo dramaticamente suas emissões.
Dialogando com as críticas, é importante notar que o Brasil não é uma economia de baixo carbono, pelo contrário. Em 2005, nossas emissões somaram 2,2 bilhões de tCO2e, o que representava uma emissão per capita de 12 t, ou seja, quase o dobro da emissão per capita global que é de 7 tCO2e/hab. Com a queda do desmatamento, entre 2005 e 2012, as emissões caíram para 1,5 bilhões de toneladas e reduziram a emissão per capita a pouco mais de 7 tCO2e/hab, muito semelhante a média global.
IPCC – Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, estima que devemos reduzir em 80% as emissões globais até 2050 para termos chances mínimas de estancar em até 2oC o aumento da temperatura global. Isso significa chegar, em 2050, a uma emissão per capita de 1 t/ha (10 Gigatoneladas (Gt) / 9-10 bilhões de habitantes). Isso é economia de baixo carbono: 1 tCO2e/ha!
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setor energético é o que mais aumenta as emissões no Brasil. Dados preliminares apontam que, em 2012, pela primeira vez, o desmatamento deixou de ser a principal fonte de emissões, papel que cabe, agora, ao setor de energia por conta da queima de combustíveis fóssies. Ele já representa mais de 30% das emissões brasileiras. Em 2011, a emissão per capita deste setor no Brasil já superava 2 tCO2e/habitante, o dobro de uma economia de baixo carbono. Precisamos nos preparar para reduzir nossas emissões e não aumentá-las como vimos fazendo.
A responsabilização dos países dos desenvolvidos é necessária, porém insuficiente para mudar a trágica trajetória das emissões atuais. Estes países representam menos de 40% das emissões globais. Mesmo que reduzam a zero suas emissões imediatamente, ainda será preciso reduzir pela metade as atuais emissões dos países em desenvolvimento.
As termoelétricas que forem contratadas agora, começarão a entregar energia (e emissões) em 2018 por pelo menos 25 anos (prazo do contrato). Isso significa cerca de 370 milhões de tCO2e durante este período. Em 2015, está previsto o fechamento de um novo acordo global sobre clima, que deve vigorar a partir de 2020 e prevê metas e compromissos para redução de emissões de gases de efeito estufa para todos os países. Este processo levará fatalmente à incorporação dos custos das emissões em qualquer projeto ou iniciativa. O Brasil, que é um dos maiores emissores, certamente terá papel importante neste esforço global.
Esta realidade na qual – queiramos ou não – seremos protagonistas, precisa estar claramente detalhada no planejamento dos leilões de energia do Brasil. Se a contratação de termoelétricas for mesmo inevitável, os contratos dos leilões devem prever, de forma explícita, a possiblidade de precificar ou taxar as emissões ou, ainda mais efetivo, exigir a compensação das mesmas de todos os empreendimentos energéticos. Se isso não for definido como diretriz agora, teremos enormes dificuldades para reduzir as emissões no futuro sem quebra de contratos e infindáveis processos judiciais.
Embora 15 milhões de tCO2 (que podem ser emitidos pelas novas termoelétricas) não representem um aumento expressivo nas emissões totais do Brasil, elas demostram descuido com os compromissos do país com a agenda climática global e o bem estar desta e das futuras gerações.
Como se dizia nos protestos de junho: “não é pelos 20 centavos”. Neste caso, não é pelos 15 MtCO2.