Estava em Itacoatiara no interior do Amazonas quando ouvi falar de um luthier que queria montar uma escola de luteria em Manaus usando espécies da Amazônia. Fiquei muito intrigado afinal é muito inesperado produzir violões numa cidade com 90% de umidade e ainda usando espécies desconhecidas da Lutheria. Arrumei um jeito de encontrá-lo no dia seguinte. Nos encontramos num pequeno restaurante de beira de estrada próximo de Rio Preto da Erva.
Havia anos Rubens vinha pesquisando o uso de madeiras da Amazônia que coletava em pastos queimados e áreas abandonadas para fazer violões artesanais – a arte da Lutheria. Foi professor de música e Lutheria numa faculdade amazonense, mas queria lidar com os sem oportunidade, com a periferia e resolveu abrir uma escola para crianças e jovens aprenderem o ofício. Estava se instalando bairro do zumbi, na violenta zona leste de Manaus. Precisa de apoio para dar o pontapé inicial na escola, me contou. Sempre me interessei pela interface entre música, e florestas afinal não são poucas as espécies raras utilizada para criar os instrumentos como Ébano para os Clarinetes, Jacarandá da Bahia e Mogno para os violões e claro o Pau Brasil para os arcos de violino. Eu contei do trabalho que fazíamos para promover o manejo sustentável da floresta e ele imediatamente associou as duas ideias – “excelente, daqui pra frente vamos usar madeiras certificadas”.
Eu perguntei se o instrumento era bom mesmo e sua resposta foi me entregar uma caixa com um de seus violões e emendar: “você está indo para São Paulo né? Leva este Rubens Gomes e teste. Se não for bom eu faço outro até ficar bom”.
Uma semana depois fui a Rio encontrar o amigo Perfeito Fortuna. Levamos o violão para Turíbio Santos e o Paulinho da Viola avaliarem. Ficaram encantados com o fato de ter nas mãos um instrumento tão bom vindo de um luthier desconhecido da Amazônia e com madeiras que nunca tinham visto. Voltei a Manaus e meses depois nascia a Oficina Escola de Lutheria da Amazônia na sala da casa do Rubens e atendendo jovens da periferia de Manaus.
Rubão era essa pessoa marcante que todos lembrar como e onde o conheceram.
Via a Lutheria como uma arte e ciência capaz de transformar a vida de uma pessoa, uma família, uma comunidade e toda Amazônia. Era capaz de passar horas me explicando como o corte da madeira deveria ser feito para que o som fluísse harmônico ao mesmo tempo que cuidava para que quem aprendesse na escola enxergasse o mundo a sua volta.
Se embrenhava pela floresta e as comunidades para promover o manejo florestal sustentável não só de madeira mas de açaí, castanha, peixe e o que mais houvesse.
Cordial e com um jeito informal nos fazia ficar à vontade mesmo nas conversas mais difíceis. Transitava bem em qualquer situação, conversando com o CEOs das empresas, produtores extrativistas, celebridades, ministros, cientistas e indígenas.
Teimoso, muito teimoso. E não tinha tempo ruim. Tudo tinha um jeito. Brigava com todo mundo quando se tratava de defender a Amazônia mas sempre terminava com um churrasco e alguma ideia para ir a frente.
Em nossos encontros o Açaí está estava sempre presente. Nunca se conformou com minha mistura com mel – Açaí é com peixe e farinha! Dizia resignado.
Músico, luthier, educador e ativista por onde passou Rubens deixou um legado de diálogo e construção para um mundo sustentável. Foi assim no FSC, no Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), na Associação do Produtores Florestais de Boa Vista dos Ramos e na Cooperativa Amazonbai do seu Amapá entre tantas outras iniciativas que tiveram o privilégio de contar com o Rubão.
Mesmo acometido de um enfisema que o levaria a um transplante de pulmão em 2018, nunca parou de trabalhar e pensar a Amazônia.
Quando fui visita-lo em Porto Alegre após o transplante sentamos com a Jéssica – a inseparável esposa e companheira de todas as horas – e por horas enquanto comíamos um peixe com Açai (o meu com bastante mel) ele falou dos planos para os próximos 30 anos (afinal o pulmão é novinho, dizia).
Rubão é pra mim e a outra forma de dizer mestre e amigo.
A Amazônia perdeu um guerreiro, o socioambientalismo perdeu uma referência e eu perdi o chão.
Rubão, vou comer um Açai do Bailique com farinha e peixe do jeito que vc sempre insistiu ser o certo.
Vai em paz amigo.
Havia anos Rubens vinha pesquisando o uso de madeiras da Amazônia que coletava em pastos queimados e áreas abandonadas para fazer violões artesanais – a arte da Lutheria. Foi professor de música e Lutheria numa faculdade amazonense, mas queria lidar com os sem oportunidade, com a periferia e resolveu abrir uma escola para crianças e jovens aprenderem o ofício. Estava se instalando bairro do zumbi, na violenta zona leste de Manaus. Precisa de apoio para dar o pontapé inicial na escola, me contou. Sempre me interessei pela interface entre música, e florestas afinal não são poucas as espécies raras utilizada para criar os instrumentos como Ébano para os Clarinetes, Jacarandá da Bahia e Mogno para os violões e claro o Pau Brasil para os arcos de violino. Eu contei do trabalho que fazíamos para promover o manejo sustentável da floresta e ele imediatamente associou as duas ideias – “excelente, daqui pra frente vamos usar madeiras certificadas”.
Eu perguntei se o instrumento era bom mesmo e sua resposta foi me entregar uma caixa com um de seus violões e emendar: “você está indo para São Paulo né? Leva este Rubens Gomes e teste. Se não for bom eu faço outro até ficar bom”.
Uma semana depois fui a Rio encontrar o amigo Perfeito Fortuna. Levamos o violão para Turíbio Santos e o Paulinho da Viola avaliarem. Ficaram encantados com o fato de ter nas mãos um instrumento tão bom vindo de um luthier desconhecido da Amazônia e com madeiras que nunca tinham visto. Voltei a Manaus e meses depois nascia a Oficina Escola de Lutheria da Amazônia na sala da casa do Rubens e atendendo jovens da periferia de Manaus.
Rubão era essa pessoa marcante que todos lembrar como e onde o conheceram.
Via a Lutheria como uma arte e ciência capaz de transformar a vida de uma pessoa, uma família, uma comunidade e toda Amazônia. Era capaz de passar horas me explicando como o corte da madeira deveria ser feito para que o som fluísse harmônico ao mesmo tempo que cuidava para que quem aprendesse na escola enxergasse o mundo a sua volta.
Se embrenhava pela floresta e as comunidades para promover o manejo florestal sustentável não só de madeira mas de açaí, castanha, peixe e o que mais houvesse.
Cordial e com um jeito informal nos fazia ficar à vontade mesmo nas conversas mais difíceis. Transitava bem em qualquer situação, conversando com o CEOs das empresas, produtores extrativistas, celebridades, ministros, cientistas e indígenas.
Teimoso, muito teimoso. E não tinha tempo ruim. Tudo tinha um jeito. Brigava com todo mundo quando se tratava de defender a Amazônia mas sempre terminava com um churrasco e alguma ideia para ir a frente.
Em nossos encontros o Açaí está estava sempre presente. Nunca se conformou com minha mistura com mel – Açaí é com peixe e farinha! Dizia resignado.
Músico, luthier, educador e ativista por onde passou Rubens deixou um legado de diálogo e construção para um mundo sustentável. Foi assim no FSC, no Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), na Associação do Produtores Florestais de Boa Vista dos Ramos e na Cooperativa Amazonbai do seu Amapá entre tantas outras iniciativas que tiveram o privilégio de contar com o Rubão.
Mesmo acometido de um enfisema que o levaria a um transplante de pulmão em 2018, nunca parou de trabalhar e pensar a Amazônia.
Quando fui visita-lo em Porto Alegre após o transplante sentamos com a Jéssica – a inseparável esposa e companheira de todas as horas – e por horas enquanto comíamos um peixe com Açai (o meu com bastante mel) ele falou dos planos para os próximos 30 anos (afinal o pulmão é novinho, dizia).
Rubão é pra mim e a outra forma de dizer mestre e amigo.
A Amazônia perdeu um guerreiro, o socioambientalismo perdeu uma referência e eu perdi o chão.
Rubão, vou comer um Açai do Bailique com farinha e peixe do jeito que vc sempre insistiu ser o certo.
Vai em paz amigo.