sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Governança sobre Mudanças Climáticas no Brasil

É comum me perguntarem quem fala, pergunta ou interage no governo sobre temas relacionados a mudanças climáticas. São tantas siglas, instituições e instrumentos de regulação que, muitas vezes – até para os iniciados -, é difícil se localizar.
Aqui, vou tentar indicar um pouco o caminho das pedras para facilitar a compreenssão de quem é quem e faz o que na governança de clima em  nível federal no Brasil.
POLÍTICA DO CLIMA E REGULAMENTAÇÕES
Politica Nacional de Mudanças Climáticas é definida na Lei 12.187 de 29 de dezembro de 2009 que determina, entre outros aspectos (i), a meta brasileira de redução 36,1 a 38,9% nas emissões de gases de efeito estufa (GEE)  até 2020, comparando com o cenário tendencial, e (ii) a necessidade de se criar planos setoriais de mitigação e adaptação as mudanças do clima.
A lei foi regulamentada pelo Decreto 7.390 de 9 de setembro de 2010 que estabelece (i) valor de emissões no cenário tendencial (ou valor de referência) para 2020, o que permite tranformar a meta em um valor máximo de emissão de 2 GtCO2e em 2020; (ii) o conteúdo mínimo dos planos setoriais – inclusive com metas especificas e (iii) a publicação de estimativas anuais de emissões de gases de efeito estufa pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O Decreto também incorpora, na regulamentação nacional, os compromissos de ações de mitigação de emissõesapresentados à UNFCC quando da adesão ao Acordo de Copenhague.
Diversos estados possuem politicas e programas estaduais de mudanças climáticas, inclusive alguns com metas específicas. Um levantamento  realizado pelo NESA/USP em parceria com o Fórum de Ação Empresarial sobre Mudanças Climáticas identificou mais 17 estados com instrumentos específicos estaduais de regulação associada à política de mudanças climáticas.
INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Para implementação da Politica Nacional de Mudanças Climáticas, há uma série de instrumentos para implementação que incluem:
  • Plano Nacional de Mudanças Climáticas: estabelecido em 2008, está atualmente em processo de revisão e visa Identificar, planejar e coordenar as ações para mitigar as emissões de gases de efeito estufa geradas no Brasil;
  • Plano Nacional de Adaptação as Mudanças Climáticas: ainda em processo inicial de elaboração, visa preparar o Brasil para o enfrentamento das mudanças climáticas que afetam as áreas de infraestrutura, saúde, segurança das pessoas e conservação do solo, água e biodiversidade;
  • Plano Nacional de Gestão de Riscoa e Resposta a Desastres Naturais: organiza as ações de identificação e alerta para desastres naturais bem como ações de prevenção e mitigação de riscos à vida humana associados a estes desastres;
  • Inventário Nacional de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa:documento publicado em intervalos de 4/5 anos que contém um detalhado inventários de todas as fontes de emissão e remoção de gases de efeito estufa no Brasil. A partir de 2013, passaram a ser elaboradas também estimativas anuais de emissão;
  • Planos Setoriais de Mitigação e Adaptação as Mudanças Climáticasabrangem diferentes setores da economia definindo ações, indicadores e metas para mitigação das emissões e adaptação para as mudanças climáticas. Os planos abrangem os seguintes setores: prevenção e controle do desmatamento; agricultura, energia, indústria de transformação, mineração, siderurgia, transportes e saúde. Pesca e gestão de resíduos também devem ter planos elaborados, mas ainda sem prazo;
  • Relatório Nacional de Avaliação sobre Mudanças Climáticas (RAN): publicado em sua primeira versão em 2013, apresenta os avanços do conhecimento sobre as mudanças climáticas no Brasil. Também analisa e identifica as necessidades de mitigação e adaptação às mudanças do clima. O RAN é elaborado pelo Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas.
Também existem dois mecanismos específicos de financiamento:
  • Fundo Clima: que recebe recursos do tesouro para aplicação em projetos, estudos e empreendimentos que visem à mitigação da mudança do clima e à adaptação a seus efeitos e
  • Fundo Amazônia: capta recursos de doações proporcionais às reduções de emissão por desmatamento e aplica em projetos que promovam a conservação e o uso sustentável da floresta.
INSTITUIÇÕES E ÓRGÃOS COLEGIADOS
A pensar a importância estratégica do tema das mudanças climáticas e a imensa carga de regulação, ação e monitoramento envolvida, o Brasil não possui, em nível federal, um órgão específico de regulação e execução da política nacional de mudanças climáticas ou, mesmo, uma comissão colegiada nacional deliberativa, com participação dos entes defederados e da sociedade civil. No seu lugar existe uma intrincada gama de instituições e órgãos colegiados.
No governo federal, a agenda climática tem, como pontos focais, os ministérios do Meio Ambiente (MMA) e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). No MMA, foi criada em 2008 a Secretaria de Mudanças Climáticas (atualmente, o secretário é Carlos Klink)e, no MCT, o tema é tratado pela Coordenação Geral de Mudanças Climáticas vinculada e a Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento (o secretário é o climatologista Carlos Nobre).
Em geral, os assuntos relacionados ao desenvolvimento da articulação federativa, planejamento e regulação setorial, além do desenho de políticas públicas de mitigação e adaptação, são digeridas pelo MMA e os assuntos ligados à pesquisa e inovação, estimativas e inventários de emissões e gestão do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) são tratados pelo MCTI.
Dada a dimensão do tema desde os anos 90, existem mecanismos de articulação mais ou menos efetivos ou determinantes ligados ao centro do governo, seja na Presidencia da República ou na Casa Civil.
Atualmente, a principal instância de decisão sobre politica de clima é a Comissão Interministerial sobre Mudancas do Clima (CIM) formada por representantes em nível de secretariado e de 16 ministérios sob a presidência da Casa Civil. O CIM se reúne uma ou duas vezes ao ano e possui um Grupo Executivo sobre Mudancas do Clima (GEx) coordenado pela Casa Civil, pelo MMA e pelo MCTI que, na prática, opera a agenda de trabalho de implementação da política e o Plano Nacional de Mudanças Climáticas. De fato, acompanhar as memórias das reuniões do Gex (em geral mensais ou bimestrais) é, hoje, e a maneira mais prática de acompanhar o andamento das discussões da política de clima em nível federal.
O Gex opera uma série de subgrupos (sempre governamentais) como GT Monitoramento, GT Adaptação e GT REDD (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal) e GT Mercado de Carbono (que encerrou atividades em 2012). Além destes existe uma inciativa chamada Núcleo de Articulação Federativa que visa harmonizar e/ou integras as políticas estaduais de mudanças climáticas com a política nacional.
Um outro colegiado interministerial denominado Comissão Interministerial para Mudanças Climáticas (CIMGC) confunde mesmo, o nome e a composição é muito similar ao CIM…. - é reponsável por aprovar os regramentos e os projetos para aplicação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto.
Em 2000, foi criado o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, dirigido pelo Presidente da Republica e que, em tese, funciona como uma espécie de caixa de ressonância das demandas e percepções da sociedade sobre o tema. O Fórum não tem função deliberativa e sua composição é bastante fluida e flexível. Atualmente, tem apoiado a realização de consultas públicas para processo de atualização do Plano Nacional de Mudanças Climáticas.
Para disseminar conhecimentos sobre causas e efeitos das mudanças climáticas, em 2008, foi estabelecida a Rede Clima – Rede Brasileira de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais, que reúne dezenas de grupos e instituições de pesquisa no Brasil e mobiliza estrutura (como o supercomputador Tupã) e recursos para propiciar o avanço e a disseminação da pesquisa de clima no país. O trabalho da Rede Clima se distribui em várias sub-redes temáticas.
Também em 2008, foi constituído o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas que tem como objetivo central reunir, sintetizar e avaliar as informações sobre mudanças climáticas (em grande parte fomentadas pela Rede Clima) e produzir o Relatório Nacional de Avaliação (RAN).
E não para por aí! Ainda existem fóruns estaduais, observatórios de clima e dezenas de outras inciativas. Mas, para orientação geral sobre como funciona a gestão das mudanças climáticas no Brasil, este é um bom começo.